01 maio, 2009

Pessoas e seus quilos de estimação

Kirstie Alley ficou famosa nos Estados Unidos ao estrelar a série de TV "Cheers" nos anos 80. Mais tarde, fez o papel damamãe na trilogia "Olha Quem está Falando". Anos depois, foi a estrela de Veronica's Closet. Loura, ótima atriz, engraçada, a atriz sempre teve um corpão grandão, mas nunca foi considerada gorda. Era linda e grande. Em 2004 ela foi fotografada totalmente obesa. Dois anos depois, foi ao programa de Oprah Winfrey exibir as curvas que conseguiu resgatar com muito, muito esforço, privações, dietas e muito exercício. Agora, três anos depois, Kirstie volta ao show de Oprah quase deformada com a obesidade. Prometeu perder tudo e aparecer de novo em um biquíni. Disse que vai lançar sua própria linha de produtos para emagrecer.

Deu dó de Kirstie. Para uns, dó de ela ter desperdiçado todo o esforço feito. Para mim, deu dó de ela não aceitar quem ela realmente é. Ela está numa eterna briga consigo mesma para manter uma imagem que ela - e praticamente todos em sua volta - acham que é o "saudável".

Perder 30 quilos em um ano, adotar, quase que de uma hora para outra, uma rotina diária de exercícios que ela não estava acostumada, um cardápio que não trazia a ela nenhum tipo de prazer, apenas a obrigação de perder, perder, perder... Kirstie juntou toda a auto-estima que conseguiu resgatar e encarou a parada. Perdeu tudo, entrou no biquíni no programa da Oprah e calou a boca de todos que a criticavam. Menos a dela mesma. Em sua cabeça, ela não estava feliz pelo corpão de volta, estava revoltada por ser obrigada a se privar de prazeres que ela sempre adorou: festas, comida, bebida, orgias em geral. A atriz transformou sua academia em sala de jantar. Uau, incrível como estava escrito na cara dela.

O ano em que "passou fome", sua cabeça não se adaptava, não conseguia acreditar em como ela podia trocar uma bela macarronada por três folhas de alface com limão - TODO DIA. E Kirstie lutava contra esse pensamento constantemente, mas quando ela perdia a batalha era a hora em que a ansiedade a dominava por completo e ela comia três vezes mais do que estava acostumada: agora seriam três pratos de macarronada, pra garantir... "vai que depois eu tenho que voltar a comer alface todo dia, melhor aproveitar".

Parecia que cada vez que Kirstie se via na frente de um prato de comida, pensava que poderia ser o último. Comia desesperadamente e em seguida, se sentia culpada. Suas duas realidades se chocavam: seu corpo queria comer, mas sua mente dizia não. Resultado: hoje ela está mais obesa do que em 2004. Infeliz, desesperada e decidida a recuperar o corpo perdido.

O que Kirstie - e eu e todas as mulheres do mundo - não consegue aceitar é que aquele corpo não é o dela. Em seu inconsciente, a cobrança pelo corpo perfeito, magro, malhado e "com braços de Michelle Obama", nas palavras de Kirstie, é uma coisa totalmente irreal. E quanto mais ela luta para se desfazer do que é, mais seu corpo briga de volta e a ansiedade a leva ao exagero.

Santa mãe... se em vez de perder 30 quilos, ela resolvesse fazer ioga ou alongamento, caminhar até a padaria e pedir um café e um pão com manteiga. Se em vez de três folhas de alface com limão ela criasse um belo prato colorido de salada acompanhado de um pedaço pequeno de costela bem temperada. Se em vez de se lamentar por não poder ser Kate Moss ela olhasse no espelho e tivesse orgulho de ser ela mesma e cuidasse de si.

Para emagrecer, é preciso estar feliz, e não o contrário. Ansiedade, cobrança, histeria, disciplina militar fazem parte da rotina de quem não acredita em si mesmo.

Quem tem o corpo "fora do padrão" vive tendo que lidar com a cobrança externa para emagrecer e não consegue curtir sua realidade.

Para quem não me conhece, pode trocar todos os "Kirstie" do texto e botar "Juju". Eu também perdi muito peso em 2006 e ele já está todo de volta, mas estou longe de ser obesa - precisaria ganhar uns 25 quilos pra isso. Mas a cabeça descrita aqui é a minha. O pensamento doentio com comida, a ansiedade incontrolável, o desespero de achar que nunca mais vai poder tomar um sorvete na vida.

Sei da alegria de muitas mulheres que dizem "Entrar num jeans 42 é impagável".

Pois eu digo outra coisa: entrar no meu jeans 46 que está no armário há dez anos é muito melhor do que passar fome por três meses para entrar na 42, coisa que não durou mais de um ano, e depois se desesperar porque está quase apelando pro 48.

Vamos parar com essa loucura de uma vez por todas.